por Thiago Kempen
Nos últimos anos, a odontologia estética passou por transformações tecnológicas marcantes, especialmente devido à popularização dos sistemas digitais CAD/CAM. Esses avanços trouxeram rapidez, eficiência e previsibilidade ao trabalho de dentistas e laboratórios, mas também deram origem a uma tendência controversa: a preferência por dentes cada vez mais brancos, pouco anatômicos e artificialmente perfeitos – os chamados “dentes chiclete”.
Famosos, jogadores de futebol, cantores populares e influenciadores digitais abraçaram rapidamente essa estética uniforme, fazendo com que o público associasse esse sorriso simplificado a sucesso e status social. Porém, o que muitos não percebem é que essa padronização, potencializada pelas bibliotecas limitadas dos softwares CAD, pode estar simplificando demais algo que tradicionalmente exigia profunda técnica e conhecimento detalhado da anatomia e da função dental.
Historicamente, a odontologia estética valorizava a naturalidade e a mimetização dos dentes reais através da técnica de estratificação cerâmica. Essa abordagem exigia não apenas tempo, mas principalmente alta qualificação técnica, habilidade artística e profundo conhecimento em anatomia dental. Por outro lado, hoje predomina a maquiagem cerâmica, uma técnica mais simples e econômica, que proporciona rapidez na entrega, porém com resultados estéticos significativamente mais superficiais e menos personalizados.
Aqui reside um ponto crucial de debate: será que essa simplificação decorre de uma preferência genuína dos pacientes ou é apenas consequência da facilidade e economia trazidas pela digitalização? Será que os pacientes estão realmente cientes da diferença entre um trabalho altamente personalizado e um sorriso padronizado e rápido? A discussão ganha ainda mais profundidade quando se considera a qualidade técnica e a durabilidade dessas restaurações menos individualizadas a longo prazo.
Um fenômeno semelhante pode ser observado na arquitetura atual. Antigamente, cada construção refletia um estilo único e detalhado, revelando o caráter e a individualidade de seus proprietários e arquitetos. Hoje, porém, testemunhamos uma homogeneização preocupante: casas, prédios comerciais e clínicas odontológicas cada vez mais se parecem, com linhas retas, materiais padronizados e uma falta marcante de originalidade e diferenciação. Isso levanta uma questão intrigante: será que nossas bocas seguirão o mesmo caminho das nossas casas, todas iguais, previsíveis e sem personalidade?
Outro fenômeno que merece reflexão é a mudança estrutural que vem ocorrendo no mercado odontológico. Cada vez mais clínicas têm optado por abrir laboratórios próprios, enquanto técnicos em prótese dentária (TPDs) buscam graduação em odontologia. Essa convergência cria um cenário intrigante, similar ao que foi observado nos laboratórios de análises clínicas há décadas, mas com uma diferença crucial: na medicina, hospitais perceberam vantagens na terceirização dessas análises, evitando investimentos em laboratórios próprios. Será que a odontologia vai seguir esse mesmo rumo, ou estamos caminhando para uma saturação perigosa do mercado, onde clínicas e laboratórios disputarão o mesmo espaço?
Paralelamente, o crescimento exponencial do uso de resinas diretas pelos dentistas – frequentemente guiados por mockups produzidos por laboratórios – também merece atenção. Essa técnica, embora econômica e imediata para o paciente, levanta questões importantes sobre o real domínio técnico dos dentistas na execução desses procedimentos diretamente em consultório. Muitos laboratórios apontam riscos significativos, especialmente relacionados à durabilidade e à qualidade estética dessas restaurações diretas.
Por fim, precisamos nos questionar: qual será o futuro da odontologia estética? Continuaremos nesse caminho de uniformização simplificada, rápida e econômica, influenciada por celebridades e pelos padrões limitados das bibliotecas CAD, ou veremos um retorno às técnicas detalhadas e profundamente técnicas de estratificação? Quem definirá esse futuro serão os profissionais, as clínicas ou os próprios pacientes?
Talvez seja o momento de pacientes, dentistas e técnicos discutirem juntos para decidir que tipo de odontologia estética realmente queremos. Afinal, quando falamos em sorrisos, será que preferimos uniformidade e praticidade ou ainda valorizamos a autenticidade e singularidade que só a verdadeira técnica pode oferecer?
ODONTOLOGIA NEWs
Odontologia News tem como principal objetivo oferecer um conteúdo rico sobre o universo odontológico para os profissionais, pensando também nos pacientes e no público em geral.
Nossos artigos apresentam atualidades e dicas preciosas sobre tecnologia, inovação e gestão para seu consultório. Fique atento ao nosso blog para manter-se sempre bem-informado.