O rápido avanço das Big Techs em direção ao mercado de saúde.
Por Anderson Fedel Marques
Em julho de 2023 a Apple registrou uma patente nos Estados Unidos para utilização de pequenos eletrodos em seus AirPods, que serviriam para captar biosinais de seu usuário. O texto do registro descreve que os sinais poderiam ser utilizados para realização de eletroencefalograma (EEG), eletromiografia (EMG), eletrocardiograma (ECG) dentre outros exames. Recursos surpreendentes, mas nem por isso inesperados. Em julho de 2022 a companhia havia divulgado um relatório falando sobre a visão de futuro da empresa. Nesse relatório, a Apple sinaliza que seus programas e dispositivos já possibilitam que usuários obtenham dados de alta qualidade, coletados noite e dia, trazendo vários insights sobre a própria saúde. Um exemplo é o Apple Watch, relógio inteligente da empresa, que oferece recursos orientados a atividades físicas e bem estar desde 2015. Longe de ser um movimento exclusivo da Apple, a caminhada de grandes empresas de tecnologia, as chamadas Big Techs, em direção ao mercado de saúde está cada vez mais proeminente, indicando uma tendência forte para os próximos anos. O imenso volume de dados que essas empresas movimentam permite gerar insights preciosos que podem ajudar de várias maneiras a estruturar ofertas de serviços de saúde. Vamos explorar nas próximas linhas como essas grandes empresas têm se movimentado para construir ecossistemas de saúde capazes de entender melhor indivíduos e grupos de pessoas e, por tabela, entrar no mercado global de serviços de saúde, que atualmente movimenta cerca de 7 trilhões de dólares por ano no mundo inteiro.
Colonização digital
É cada vez mais comum que grandes serviços de saúde hospedem seus dados em serviços do tipo nuvem. Isso quer dizer que toda a infraestrutura de informação a ser armazenada por um hospital ou plano de saúde passa a ser gerida por uma empresa terceirizada. E nesse momento entram em cenas as Big Techs. Estas empresas conseguem fornecer este tipo de infraestrutura a um custo muito mais baixo do que o equivalente a um serviço físico local. Porém, junto com o gerenciamento de dados, a empresa pode ter acesso a informações de toda a conjuntura do serviço de saúde. Sem necessidade de acessar dados pessoais ou sensíveis, é possível por exemplo trabalhar em cima de dados anonimizados para identificar padrões que ajudem a otimizar os serviços de saúde de forma global. As possibilidades são diversas e vão desde a identificação de pontos de redução de custos no sistema até tarefas mais nobres como diagnóstico precoce e prevenção de condições de saúde mais graves. Dessa forma, empresas de tecnologia podem desenvolver e oferecer produtos valiosos para sistemas de saúde. Foi o que aconteceu com a Verify, uma empresa do grupo Alphabet (Google) que aplica técnicas de Inteligência Artificial e Ciência de Dados para oferecer a empresas do setor de saúde soluções focadas na prevenção de doenças.
Wearables, IoT e o monitoramento contínuo das condições de saúde
Como mencionamos no início do texto, dispositivos utilizados por cada vez mais pessoas permitem que as Big Tech atuem não só indiretamente em serviços de saúde, mas também ofereçam um grande canal de monitoramento de indicadores do processo saúde-doença no nível do indivíduo. Os wearables, acessórios eletrônicos de uso constante, como relógios, pulseiras inteligentes, fones bluetooth e óculos de realidade aumentada, estão cada vez mais comuns e populares entre as pessoas. Estes gadgets são capazes de coletar diversas informações relacionadas a saúde e bem-estar de seus usuários. Em conjunto com a perspectiva de Internet of things (IoT), ou seja, da interconexão constante destes dispositivos à rede, temos a possibilidade de monitoramento remoto de sinais de saúde importantes de qualquer pessoa, 24 horas por dia, 7 dias por semana. Desta forma, grandes empresas de tecnologia podem ter acesso a indicadores vitais de milhões de pessoas em tempo real. Algo semelhante só era possível, até pouquíssimo tempo atrás, em pequena escala com pacientes internados em centros médicos.
A Odontologia em um mercado de dados e tecnologia
Levando em consideração a crescente digitalização de informações clínicas e serviços em Odontologia, não é difícil imaginar que a presença de empresas de tecnologia se torne cada vez mais forte também nessa área. A coleta e análise de dados das condições bucais de pacientes já é uma possibilidade, por exemplo, para operadoras de planos de saúde. Nesse caso, o conjunto de informações anonimizadas obtidas através de anamneses, exames de imagem e procedimentos pode oferecer insights valiosíssimos sobre o processo saúde-doença de uma população de beneficiários. Outra realidade também já presente é o monitoramento remoto de situações relacionadas à Odontologia. Um exemplo interessante deste cenário é a seguradora americana Beam. A empresa oferece planos odontológicos onde os usuários são estimulados a utilizar escovas de dente inteligentes. Estes dispositivos são capazes de detectar hábitos de escovação de seus usuários e enviar os relatórios de uso à empresa. Com esses dados, a seguradora oferece recompensas àqueles clientes que apresentam bons hábitos de higiene bucal. Também já existem iniciativas para acompanhamento à distância de condições clínicas presentes na cavidade oral. Empresas como Grin (EUA) e Dental Monitoring (França), por exemplo, oferecem dispositivos que são acoplados ao celular e permitem a aquisição de imagens intrabucais de alta qualidade para acompanhamento remoto de pacientes ortodônticos. Focadas principalmente no mercado de alinhadores, estas empresas oferecem uma solução para pacientes que requerem acompanhamento contínuo do profissional. Com estes dispositivos, o ortodontista pode identificar situações de atenção especial antes mesmo do paciente sentar na cadeira odontológica.
Perspectivas para o futuro
É difícil afirmar exatamente como será a relação de grandes empresas de tecnologia com o setor de saúde nos próximos anos. Além de desenvolver as próprias soluções, estes conglomerados têm adquirido diversas startups e empresas de saúde ao redor do mundo dia após dia. A tendência é crescente. As tecnologias já existentes podem revolucionar a forma como as pessoas acessam e recebem atendimento de saúde no mundo todo. Iniciativas como Amazon Clinic, serviço de atendimento médico remoto da Amazon, mostram que estas empresas têm potencial até mesmo para oferecer soluções de atendimento primário ao usuário. É importante que estejamos atentos às oportunidades e desafios que essas novas configurações do setor podem proporcionar. As Big Techs estão hoje entre as empresas mais valiosas do mundo. A junção de alta capitalização de mercado e possibilidade de ação em larga escala tem o potencial de impactar fortemente o mercado de saúde nos próximos anos.
Referências:
- https://www.sbs.ox.ac.uk/oxford-answers/how-big-tech-breaking-healthcare-sector
- https://verily.com/
- https://www.beambenefits.com/dental
- https://www.get-grin.com/
- https://dentalmonitoring.com/
- https://clinic.amazon.com/
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